- Amigo Patrício, como vão essas pescarias?...
Estendi a mão a este meu conhecido, septuagenário ou lá perto, engenheiro reformado e companheiro de pesca de um velhote amigo meu. Mentalmente, ordenei a mim próprio: “Não lhe perguntes pela saúde, não lhe perguntes pela saúde!...”
- Olhe, fui até à Expo, um dia destes, mas não deu nada. – Respondeu-me.
Preparava-me para me despedir e fazer uma retirada estratégica, quando aquilo que eu tanto temia se iniciou.
- Veja lá que a fazer um lançamento deu-me uma dor nas costas. Foi uma coisa terrível. Desisti da pesca e fui para casa, sempre com a maldita dor...
- Acontece, amigo Patrício, acontece. Se me dá licença...
- No outro dia tive que ir ao médico, ao meu médico de família. Mandou-me fazer umas radiografias. Voltei lá a mostrá-las e mandou-me para um especialista.
- Isso há-de passar... Há-de passar. Se me dá licença...
- Espere aí. Sabe o que é que o ortopedista me disse? É um especialista muito conceituado. É o Professor Fernando... Fernando... ai...
- Bom, não interessa, gosto em vê-lo, as melhoras...
- Alarcão. Fernando Alarcão. Conhece?
- Não... Eu vou...
- É muito conhecido. Trabalhou no Hospital Particular... Ou foi no da CUF?...
- Bom isso agora não interessa. Está melhor e isso é que é preciso.
- Ouça, espere aí... Sabe de quem é ele cunhado? Daquele cirurgião muito conhecido, o... o... ai... o... bolas, tenho nome debaixo da língua.
- Depois se lembra. Gosto em vê-lo.... Eu...
- Januário. Januário Lopes. Aquele que é chefe dos serviços de cirurgia torácica do Hospital Curry Cabral.
- Bom, está bem, para mim é um perfeito desconhecido. Está melhor não está? Isso é que interessa. Agora...
- Não é bem assim, o Professor Alarcão, quando viu os exames, disse: “Eh lá! Isto está feio”. A enfermeira, que é prima de uma rapariga ruiva que pára muito naquele café da praceta, naquele de esquina...
- Oh amigo Patrício eu estou com uma certa pressa, sabe. Até à...
- É só mais um bocadinho. Pois a enfermeira olhou para mim com uma cara... Ela chama-se... Lisete. Não, não, Rosete. Não, espere lá, Suzete. Suzete é que é. Se calhar você conhece o marido, que tem um táxi na praça da...
- Passe bem amigo Patrício, eu quero lá saber do marido da enfermeira do especialista que é cunhado do fulano que é chefe de sei lá já o quê. Tenha paciência que eu vou andando.
- Espere, sabe o que é que me fez bem? Felizmente já não me dói nada.
Cedi.
- Não. O que é que lhe fez bem?
- Foi a ida a um endireita, ali a uma aldeia próxima de Alenquer, que me foi recomendado pelo Narciso, aquele rapaz que é primo da moça da tabacaria. A filha da Felismina da banca dos jornais...
- ...
- Espere, espere. Aonde é que você vai com tanta pressa. Francamente!...
- Vou ao médico, amigo Patrício. Vou ao médico. – Disse eu em andamento. - A um que é primo do sogro do irmão da cunhada do Valério. Irra!!!... Se fico aqui mais um bocadinho ainda fico maluco.
Já ia bem afastado e ainda ouvi o chato do Patrício vociferar:
- Mal educado. Você faz-me lembrar o Mendonça. Não, não, o Coelho, aquele que é sobrinho...
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Nota: Diálogo baseado em muitos e variados diálogos infelizmente bem reais. Ufff!